10.9.08

All Our Yesterdays

Quero saber de quem é o meu passado.
De qual desses que fui? Do genebrino
Que compôs um hexâmetro latino
Que os lustrais anos têm apagado?
É da criança a procurar na inteira
Biblioteca do pai as pontuais
Curvaturas do mapa e as ferais
Formas que são o tigre e a pantera?
Ou daqueloutro que empurrou uma porta
Por trás da qual um homem lá morria
Para sempre, e beijou no claro dia
A face que se vai e a face morta?
Sou os que já não são. Inutilmente
Sou esta tarde essa perdida gente.

Jorge Luís Borges (A Rosa Profunda)

8.9.08

Não é uma salvação

Não és os outros

Não há-de te salvar o que deixaram
Escrito aqueles que o teu medo implora;
Não és os outros e encontras-te agora
No meio do labirinto que tramaram
Teus passos. Não te salva a agonia
De Jesus ou de Sócrates ou o forte
Siddharta de ouro que aceitou a morte
Naquele jardim, ao declinar o dia.
Também é pó cada palavra escrita
Por tua mão ou o verbo pronunciado
Pela boca. Não há pena no Fado
E a noite de Deus é infinita.
Tua matéria é o tempo, o incessante
Tempo. E és cada solitário instante.

Jorge Luís Borges (A Moeda de Ferro)